A PEC 45 de 2019, que trata da Reforma Tributária, foi aprovada na Câmara dos Deputados em julho de 2023. Mas como a nova legislação vai impactar o setor farmacêutico e o dia a dia das farmácias? Quem explica é Jiovanni Coelho, especialista em Tributação e Pricing da Sintax.
De acordo com ele, no geral, os preços dos medicamentos para o consumidor final devem se manter ou sofrer pouca alteração, mas, se os outros impostos aumentarem, pode ser que haja uma necessidade de elevar os preços devido à alta carga tributária sobre serviços e demais produtos, por exemplo.
Reforma Tributária vai criar imposto único para farmácias?
Na verdade, o imposto único consiste na criação de dois tributos, o CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). Hoje, os impostos que pagamos são aplicados em diversas categorias do sistema tributário, que envolvem produtos, serviços e regiões (impostos municipais, estaduais e federais).
A ideia da Reforma Tributária foi criar uma regra única, mas o nível de complexidade da operação era muito alto. Por isso, o governo optou pela divisão em duas alíquotas – uma para o CBS e outra para o IBS. Contudo, ainda não sabemos como essas cobranças serão feitas, pois é preciso montar um novo sistema com novos processos para colocar a novidade em prática.
Reforma Tributária e a transição escalonada do sistema tributário
Para realizar a transição da Reforma Tributária, o Estado vai aplicar, a cada ano, aproximadamente 1% de tributo (durante dois anos, mais ou menos). Depois disso, a ideia é calcular o quanto este 1% cobrado representa sobre a arrecadação total e ir aumentando a cobrança aos poucos, ao mesmo tempo em que diminui a arrecadação dos outros tributos gradativamente.
O prazo previsto para a transição completa gira em torno de 10 anos. Portanto, no primeiro momento, serão mantidos todos os tributos atuais e ainda serão adicionados mais dois novos (CBS e IBS), o que vai aumentar a carga tributária de todas as empresas, inclusive das farmácias. Somente no futuro, os demais impostos devem ser reduzidos.
Reforma Tributária para medicamentos e serviços na farmácia
O governo alega que os medicamentos terão apenas metade da carga tributária dos outros produtos, mas ainda não sabemos quais serão os valores. Atualmente, um medicamento genérico da lista positiva tem uma carga tributária de 12% em São Paulo e Minas Gerais, por exemplo. A partir do momento em que a carga geral for para 25% (que é o valor cogitado até agora), o valor do imposto para medicamentos genéricos seria de 12,5%, ou seja, pouca coisa muda na prática. Por outro lado, alguns medicamentos podem ter a carga tributária reduzida.
O grande problema são os serviços, que representam quase 80% da receita nacional. Vamos supor que uma farmácia localizada em uma cidade vizinha de São Paulo, que paga 3% de ISS, passará a pagar 25% de ISS + 12% de contribuição social + 15% de Imposto de Renda, o que totaliza um aumento de mais de 50% da carga tributária para os prestadores de serviço, o que pode causar um desequilíbrio econômico no País devido à necessidade de recalcular os custos e preços para manter as margens de lucro.
Outro ponto é a alíquota zero para determinados medicamentos. Hoje, já existem alguns que são livres de impostos, mas estão mais presentes no setor hospitalar, por meio dos convênios criados para categorias específicas, como medicamentos para tratamento de câncer e de alto custo, por exemplo.
Questões relacionadas ao Simples Nacional, aos produtos monofásicos, ao crédito acumulado de ICMS, ao estoque de quem já pagou imposto na compra, entre outras ainda estão sem resposta e precisam ser alinhadas pelos governantes. Após a mudança das regras serem anunciadas, novos parâmetros de preço para a indústria e varejistas serão criados, impactando diretamente os preços para o consumidor final.
Reforma Tributária para a indústria farmacêutica
Muitas indústrias estão localizadas em Estados mais afastados dos grandes centros comerciais e capitais por conta dos benefícios fiscais oferecidos por algumas regiões. Porém, quando o governo definiu que não haverá mais benefício fiscal regional, ou seja, que será a mesma regra para todos os Estados, não há mais motivo para que essas indústrias fiquem onde estão.
Então, a consequência é que muitas dessas indústrias se mudem para os grandes centros comerciais, o que pode gerar desemprego nas regiões mais carentes do Brasil. Além disso, algumas empresas estão aguardando mais detalhes sobre a reforma tributária para decidir se e onde montarão suas fábricas, o que gera um cenário de grande insegurança tributária.
Afinal, como a Reforma Tributária vai impactar a farmácia?
Por enquanto, a recomendação do especialista é que os gestores de farmácias fiquem muito atentos às novidades anunciadas pelo governo e estudem bastante os tributos atuais e suas dinâmicas de funcionamentos (PIS/Confins, ICMS, IPI e ISS). A partir do entendimento dos tributos já aplicados sobre o negócio, deve-se estudar ao máximo os dois novos tributos entrantes.
Prepare-se para ter a carga tributária da venda aumentada e a carga tributária da compra alterada, o que vai demandar a implantação de um sistema de débito e crédito dos outros tributos, pois a referência de preço de compra e venda será deturpada com as alterações frequentes.
Porém, decisões sobre o negócio e precificação somente devem ser tomadas após a aplicação das novidades, pois alguns produtos podem ter sua carga tributária reduzida, enquanto outros podem manter ou até pagar mais imposto, especialmente para os serviços, como terceirização, aluguel, vacinação, delivery etc.
Este conteúdo também está disponível em formato de entrevista em vídeo no canal do Youtube da Farma Contábil, contabilidade especializada no varejo farmacêutico.